Há alguns anos atrás, pouco antes de eu começar a assistir XWP, eu fiz amizade com duas pessoas especiais, um cara e uma garota. Não cito os nomes, porque não sei se tenho esse direito. Mas foram duas pessoas muito importantes para mim, numa época em que eu estava passando por certas dificuldades. Esses dois amigos eram completamente diferentes de mim. Nós três tínhamos nossos próprios problemas, mas um sentimento de afinidade nos uniu de uma forma inexplicável. A conexão que tínhamos (ou que, pelo menos, eu sentia que tínhamos) era inexplicável: três pessoas que nunca se falaram, em questão de dois dias, se tornam unha-e-carne? Acho que isso não acontece normalmente, mas foi o que aconteceu.
Como eu disse, os três tinham seus próprios problemas, mas o problema dela era o maior. Com apenas 14 anos, ela já bebia e fumava. E para piorar a situação, não encarava aquilo como um problema. Eu e meu amigo tentamos, através de conversas, convencê-la de que aquilo não era bom. Ela ainda era muito nova para se enveredar pelo caminho incerto dos vícios. Mas ela... ela não ouvia. Podia até concordar (internamente) que suas atitudes estavam erradas, mas nunca deu o braço a torcer.
O tempo passou, e por alguma razão, nós três nos separamos, tão rápido quanto havíamos nos unido. Só que eu sempre me lembrava com carinho daqueles dois amigos tão complicados e encantadores que eu tive.
Meses mais tarde, nos reencontramos. Foi o dia do meu maior choque: ela estava usando drogas. Não é suposição. Eu vi.
Fiquei abalada. Onde é que eu estava, enquanto ela caia num vício ainda maior? Por que é que eu não me esforcei para impedir as bobagens cometidas por aquela garota tão doce ? Eu me culpava pelos problemas que sabia que ela enfrentaria... E, o pior, me culpava por não ter feito bem meu papel de amiga. Conversei com uma hebiatra, médica especializada em adolescentes... mas hoje já não lembro os conselhos que ela me deu.
Algumas vezes, tentei me aproximar dela pela internet. Puxava assunto no msn ou deixava um scrap no orkut dela. Mas não adiantava. Ficávamos na promessa de reencontrar, de combinar alguma coisa com o nosso outro amigo... Só palavras, nunca aconteceu.
Uma vez eu a vi no ônibus, no caminho pra casa. Não tive coragem de dizer um simples "oi". Já fazia muito tempo que não conversávamos; eu achava que ela nem me reconheceria (como diz minha psicóloga, eu tenho a crença que as pessoas se esquecem de mim). E fui deixando as oportunidades passar, sempre me culpando pela minha falta de iniciativa para ajudá-la.
Ontem, no caminho para casa, meu pai fez uma piada sobre uma pessoa estranha que atravessava a rua. Virei para ver quem era. Era ela. Eu não consegui salvar essa minha amiga do destino que ela traçou para si própria. Eu nem tentei. Onde é que foi parar a coragem que sempre achei que tive? E as lições que eu vi assistindo Xena? Ah... como eu queria ter a coragem daquela heroína que tanto admiro. Mas eu não tenho. Tanta coisa que eu poderia ter feito para evitar que as coisas chegassem a esse ponto, mas eu não fiz nada. Fiquei com as minhas preces e a minha esperança de que, um dia, ela acordaria e perceberia as besteiras que estava fazendo.
Que raiva eu sinto de mim.
Um outro amigo meu, que não é aquele do início desse texto, também começou a fazer escolhas erradas. No caso dele, eu tomei iniciativa, falei, orientei, briguei, ignorei, consolei... Dei todo o meu apoio para que ele tivesse forças suficientes para não cair. Algumas vezes ele tem seus deslizes, mas acredito que ele está se saindo bem. Com a minha ajuda.
Isso me alivia um pouco da culpa de não ter ajudado minha amiga, mas não alivia totalmente. E eu nem sei se um dia conseguirei me livrar da culpa. Já não há mais nada ao meu alcance para ajudá-la. Perdemos todo o contato.
Mas decidi que nunca mais vou ficar sem fazer nada pelos meus amigos. Afinal, era isso que eu tinha para aprender assistindo Xena: lutar pelas amizades, por mais complicadas que elas sejam. E nunca mais sucumbir sem coragem.